O diabo perdeu o rumo!. Que saudades do diabo.
(Trabalho apresentado no Encontro Anual da Escola da Causa Analítica do Rio de Janeiro, em 1º de setembro de 2006)
O encontro proposto pela Edca visa refletir sobre o Pai: seu lugar, suas funções. Pai é poder e perda do mesmo. Pai é ordem, é desordem, na sua falta. Pai é cais, é caos. Pai é censura, limite. Pai é conseqüência. Preço. Relação custo-benefício. Pai é lei, é fora-da-lei. É hoje, também, um banco de esperma. Um patrimônio genético, um DNA. É sentido e sem sentido. É múltiplos sentidos. Resolvi propor a vocês uma reflexão que, a mim, se faz inadiável: entender melhor — para atender, acolher, ouvir melhor —, as questões que nos são trazidas pela clínica, na atualidade, no concernente ao humano vivente e suas relações de alteridade — seu devir. O mal-estar na atualidade fala de muitas coisas, dentro de uma sociedade totalmente fragmentada e dispersa que não consegue estabelecer para si mesma, nem sequer, a imagem de unidade que daria sentido à sua própria dispersão. Vou tentar me limitar a alguns questionamentos no campo super-egóico. Super-ego (super-eu) para Roudinesco é: Conceito criado por Freud para designar uma das três instâncias da segunda tópica, juntamente com o “eu”e o “isso”. O super-eu mergulha suas raízes no “isso” e, de uma maneira implacável, exerce as funções de juiz e censor em relação ao eu (O Eu e o Isso – 1923). Em Lacan, o conceito de super-eu é objeto de múltiplas elaborações, relacionadas com a teorização do par super-eu / ideal do eu (referência do eu, simultaneamente substituto do narcisismo perdido da infância e produto da identificação com as figuras parentais e seus substitutos sociais). Nesta perspectiva, o super-eu continua dominante mas, diferente de Freud, Lacan o concebe como a inscrição arcaica de uma imagem materna onipotente, que marca o fracasso ou o limite do processo de simbolização. Nestas condições, o super-eu encarna a falha da função paterna e esta, por conseguinte, é situada ao lado do ideal do eu. Desse homem trágico encontramos a estrutura em Édipo e Hamlet. Em ÉdipoRei, o pai é morto sem que Édipo o saiba. Em Hamlet, o pai é condenado a morrer e, alma-vagante, denuncia seu matador. Assim como o tirano de Sófocles sofre seu destino como um flagelo que o torna diferente de si mesmo, o príncipe de Shakespeare o internaliza como uma imagem repetitiva do mesmo. Tragédia do
desvelamento de um lado, drama do recalcamento do outro. Desvelar, muita vez, cega. Recalcar, quase sempre, potencializa a força dijuntiva, irruptiva. — Por que parto daí? Porque, todos os dias na minha vida pessoal e profissional, sou provocada pela angústia dos eventos do nosso entorno. Tudo nos parece sem sentido, sem explicação. Excessivo!. — Por onde andará o velho e tão conhecido diabo? Aquele vermelho, de chifres, com rabo em ponta, cheirando a enxofre. Aquele que seria a outra face de Deus — por sua vez, o todo-poderoso: onipresente, onisciente, onipotente. Parece-me que todos nos abandonaram. Tanto o bem quanto o mal. E aí, de que modo vamos significar todas as catástrofes de nosso tempo? Este tempo que, apoiado em tantas descobertas tecnológicas, esperávamos ser melhor. Sem bem e sem mal, como pensar a ética, o agente ético, o sujeito ético?!. Pois, como nos ensina a filosofia, a ação ética é balizada pelas idéias de bem e mal, justo e injusto, virtude e vício. — Como assistir à TV, ler jornal, ir à escola? Como educar filhos? Amar? Atender pacientes?!.Discernir erro de crime? Perdoável de imperdoável? — Por onde anda o futuro? E o futuro de uma ilusão? E.uma ilusão? Só uma! Como?! Se o presente anda numa disparada tal que eu não o alcanço? Não o significo? Mal o suporto? Fui muito provocada por dois filmes bastante atuais: O Corte (Costa-Gravas) e Caché. Em O Corte,Costa-Gravas nos coloca diante da crueldade. Nua e crua. Horror nosso de cada dia. O protagonista nem é mau. É até um cara legal. Como tantos por aí (citar jornais). Mas, para não perder seu emprego, sua investidura simbólica, seu status quo, mata! Mata, assim! Elimina obstáculos, simplesmente. Dirão vocês: — Ora, é um psicopata. — Será?!. Caché, a princípio, achei chato. Entendi nada. Saí do cinema meio desconfortável, me achando burra. Uma semana depois, ao receber um telefonema de um suposto seqüestrador de meu marido — no meu consultório — entendi muito. Sabiam coisas da minha família, da minha casa, meus filhos, minha intimidade, suposta privacidade. Senti-me pelada no parque. Desamparada. Dividida. Sem saída.
— Saudades do diabo! Era fácil entender o mal. Era razoavelmente possível (desde Freud) defender-se dele. Negociar com ele. Sentir culpa, vergonha. Pedir perdão, ser perdoada ou não. E agora, como lidar com a crescente crueldade? Onde anda o super-ego? Ou super-eu? O olho que tudo vê? A sociedade é de espetáculos. Todos somos atores e atrizes. A-feitos e efeitos de muitas próteses. Há setenta anos, Lacan apresentou o “estádio do espelho” como base para a própria constituição do eu. Hoje não é mais o “estádio do espelho” que está em pauta, mas poderíamos falar do “estádio de clonagem” — cópias idênticas, geminadas. Eus representando eus. Os que não representam bem são excluídos. Temos que ser “assim” ou “assado”. Temos que nos vestir desta maneira ou daquela. Nosso corpo é destacável. Bocas para um lado, peitos para o outro, bundas assim. Isso para as mulheres que, se antes faziam o bolo para seus amos e senhores, hoje são o próprio bolo. Os homens — “metro-sexuais”— metro de quê?! Metrópole? Fábricas de “o mesmo”? Atletas do sexo tomam suco de Viagra e Cyallis já no café da manhã. Não para corrigir esta ou aquela disfunção, mas porque o pau não pode falhar. — São espadas! E, pobres de nós, criaturas sem criatividade. Nos filmes pornôs encontramos nosso roteiro de ohs! e uhs! Cama fria! Teatro bufo! Tédio! Melancolia! — Saudades do diabo e suas poções afrodisíacas! Pergunto a meus analisandos adolescentes se essas bocas que beijam, esses peitos que amassam, essas bundas que apertam pertencem a alguém. Têm rosto?!.Um corpo? — Dizem que sou chata. Mas voltam na sessão seguinte porque não querem beber tanto, se drogar tanto, se apagar tanto. Querem viver. Não sabem como. Não querem morrer de véspera. É “isso” que temos. Como lidar com isso? Como abrir espaço para o desconforto psíquico. Para o feio, a doença, o envelhecimento, a morte. A finitude, a dúvida.
Como chamar de volta um pouco mais de humanidade. Chamar de volta Deus e o Diabo. Nos últimos tempos, vivi muitas perdas importantes: Ilo, Helena Besserman Viana, Fédida, Derrida! Meus mestres. Muitas obras, contribuições. Reflexões sobre este humano / desumano. Fiquei “fritando” aí e resolvi ouvir alguém de fora. De outra tribo. Estudar o material de alguém que me mostrasse outros ângulos. Poderia ajudar. Escolhi Zygmunt Bauman e é ele que quero apresentar a vocês. Sociólogo polonês. Hoje em Londres, professor titular da cadeira de Sociologia em Leeds. Homem sensível, vasta obra. Em Vidas Desperdiçadas, fala do “refugo humano” ou, segundo ele mesmo, “humanos refugados”, efeito colateral da “construção da ordem e do progresso econômico”. Aos que não estão “bem” na foto: o lixo! Ou um bom Photoshop. Há outros: Amor Líquido e Sociedade Líquida, onde as relações amorosas e sociais são analisadas de maneira clara e objetiva. Que devir é esse?. Aí entendemos um pouco melhor esses peitos, bundas e paus descartáveis. Esses “eus” modernos. Sujeito não há. Há objetos. Objetos líquidos. Para respeitar o tema proposto e o tempo disponível, limitei-me à Modernidade eHolocausto. — Dirão: Holocausto?!. Outra vez?!. É, ele parte daí. Até porque é judeu. Mas todos fomos e somos atravessados, transpassados por isso que, considero, no imaginário social, como o símbolo moderno da maior crueldade. Infelizmente, provavelmente em decorrência de nossa desmemória e decorrente negação, há outros muitos Holocaustos acontecendo. Aqui no Brasil na fome, miséria, injustiça social, corrupção, hipocrisia. Em Israel, Líbano, Irã, Iraque, África. No mundo! Há Holocaustos se reproduzindo por toda parte. Não podemos deixar de ver e tentar compreender para tentar evitar. Será possível? Em Modernidade e Holocausto, o autor ressalta como o significado do Holocausto pôde ser subestimado em nossa compreensão da modernidade: ora sendo reduzido a algo que aconteceu com os judeus, ora sendo visto como representando aspectos repulsivos da vida social que o progresso da modernidade pouco a pouco irá superar. A própria experiência diária, vivida por todos nós, encarrega-se de dissolver estes engodos, disfarces, hipocrisia.
O que mais assusta nesta análise sociológica é perceber, através de vasta documentação, que a crueldade não é cometida por indivíduos desviantes, mas por homens e mulheres comuns tentando desempenhar bem suas tarefas ordinárias. Stanley Milgran (psicólogo americano de Yale), citado no livro, pontuou, como resultado de experiências, que “isso” poderia acontecer a nós — os bons! Segundo a citação, a crueldade relaciona-se apenas, secundariamente, às características individuais dos que as cometem; mas de maneira muito forte mesmo à relação de autoridade e subordinação. Poder! Olha o Pai aí! Milgran sugeriu e provou que a desumanidade — CRISTALIZAÇÃO DA CRUELDADE — é uma questão de relacionamentos sociais. Relacionamentos racionalizados: “Quanto mais racional a organização, mais fácil se torna produzir sofrimento e ficar em paz consigo mesmo”. Álibi! Derrida já nos ensinou que a crueldade / desumanidade é social na origem, muito mais que fruto de caráter. Em Estado-da-Alma, Derrida cita Einstein, em sua correspondência com Freud, onde ele diz: “No homem vive uma necessidade de odiar e aniquilar”. — O que quer dizer cruel? Crueldade? — Apagar o outro da alteridade? O outro da culpa e da vergonha? O outro das diferenças? Não ter “trabalho” com as relações? Emmanuel Lévinas, citado por Bauman, diz que “estar com os outros”, esse primaríssimo e irremovível atributo da existência enquanto humana, significa primeiro e acima de tudo responsabilidade! “Se o outro olha para mim, sou responsável por ele, mesmo não tendo assumido responsabilidade para com ele”. Minha responsabilidade é a única forma pela qual o outro existe para mim; é o modo de sua presença, da sua proximidade. Introduzi o conceito de responsabilidade por razões óbvias e porque sou uma otimista do ser. — Imagina isso numa sociedade do Ter. Mas também para chegar à moral. Moral freudiana, moral sociológica, moral religiosa. É minha intenção contra-por.
— Até por que de que tem servido todas estas “morais”? A moralidade não é um produto da sociedade. É algo que a sociedade manipula. Há a moral fascista, nazista, a moral da ditadura, dos tiranos. A moral exposta pelo filme de Costa-Gravas: a moral do Ter. Penso que, como me ensinou Derrida, é preciso quebrar os álibis e, para ele, a Psicanálise é o lugar onde se faz isso, ainda. Somente sem álibis, olhando a crueldade como inerente ao ser-ativada pelo ter-custe-o-que-custar, teremos alguma chance de chamar de volta nossas rotas humanidades. Mas é preciso olhar o horror, tocar no lixo que jogamos embaixo do tapete. É preciso reavivar lembranças, despertar memórias. É preciso não tomar PROZAC. Trabalhar arduamente para preservar a vida, como herdeiros de Freud que somos. Construir uma nova ética recheada de respeito. Como disse Joseph Weizenbaun, “é necessário, nada menos, que o surgimento de uma nova ética, uma ética das distâncias e das conseqüências distantes, uma ética mensurável segundo o alcance espacial e temporal, excepcionalmente ampliado dos efeitos da ação tecnológica. Uma ética que será diferente de qualquer outra moralidade conhecida: uma ética que se estenderia acima dos obstáculos socialmente erigidos da ação mediatizada e da redução funcional da pessoa humana”. Uma ética do respeito às diferenças, mesmo aquelas que eu não compreendo, digo eu. Uma ética sem muros. Já notaram como crescem os muros pelo mundo? Palestina e Israel, México e Estados Unidos, Espanha e África. Sem falar nos condomínios. Nos muros da “indiferença”, da “neutralidade radical”, como disse Sérgio Cabral. Paradoxalmente, enquanto o mundo virtual aproxima os distantes, a vida real constrói os muros que separam os mais próximos. Muros que não protegem. Escondem, provocam. — Crueldade é isso! É não poder chorar para não eliminar o efeito do Botox. Relato dramático de uma paciente que — corajosamente — chora, a despeito de tudo, lavando e “passando” a alma a limpo! Crueldade é farsa, é manipulação. O que fazer para inventar essa nova ética — do respeito e sem álibis?
— Uma nova leitura do Édipo de Sófocles? — Uma nova leitura do Hamlet de Shakespeare? Re-inventar o super-eu?!. Gritar bem alto, Pai?!. Termino com a Divina Comédia de Dante — na esperança de re-inventar o próprio inferno: “Os lugares mais quentes do INFERNO estão reservados para aqueles que, em tempos de grave crise ética, mantêm sua neutralidade”. Bom que, como psicanalistas, sejamos neutros, JAMAIS! Suzana Schmidt Nolasco
DER GEMEINDEAUSSCHUSS LA GIUNTA COMUNALE Nach Einsichtnahme in den vollstreckbaren Vista la deliberazione della Giunta comunale n. 540 dd. Gemeindeausschussbeschluss Nr. 540 vom 19.11.2001, 19.11.2001, esecutiva, con la quale il dott. ing. womit Dr. Ing. Wolfgang Plattner aus Bozen mit der Wolfgang Plattner di Bolzano venne incaricato del rilievo topografico e della progettazione esecu
Hofman, Beno (2002). Julia Culp: Wereldberoemde Groninger zangeres. dond. 17/12/09, was de laatste van 2009. Het was Channuka (dus kaarsen aan andere lichtfeest, en nog een mirakel), en de 1e dag van de 1e rond dikke sneeuw die 10 dagen lang bleef/blijft. De volgende dag. Historicus Beno Hofman zou toen over Julia Culp praten. Ik vroeg • correctie: het concert Jiddisch Midwolde is niet